A Orquestra Ontem e Hoje
Samuel Adler
Trad. Marcos F.M.
Aristóteles, em seu famoso discurso “Na música”, disse: “É difícil se não impossivel, para aqueles que não são performers serem bons juízes da performance dos outros.” Ele, é claro, estava se referindo a performance solo em instrumentos ou cantando. Contudo, o mesmo pode ser dito daquele que deve julgar o valor, competência, e eficácia de uma peça de música orquestral.
A experiência prática em uma área específica das artes musicais faz um compositor, maestro, professor, artista, estudante ou um profissional melhor nesse aspecto particular da música. Visto que tantos músicos lidam com o grande instrumento que chamamos de orquestra, é mais importante que o estudo de orquestração e instrumentação torne-se uma parte básica da educação de cada músico.
A orquestra é certamente uma das mais nobres criações da civilização Ocidental. O estudo de suas complexidades iluminará muitas áreas importantes da música. No total, timbre e textura esclarecem a forma, bem como o conteúdo de uma série de composições. Além disso, específicas cores orquestrais e até mesmo o espaçamento dos acordes na textura orquestral dão uma “personalidade” especial para a música dos compositores do período Classico para o nosso próprio tempo. Em um livro mais informativo chamado A História da Orquestração, Adam Carse conclui com esse julgamento:
A orquestração tem sido muita coisa para muitos compositores. Tem sido um servidor do grande, um suporte para o medíocre, e uma capa para os fracos. No passado tiveram um santuário em suas vidas através da obra dos grandes imortais, no presente ofegam depois de esforços do progresso recente, O Estudo da Orquestração e seu futuro está tão completamente escondido porque estava no final do século XVI.*
Dominar a técnica de orquestração nos leva a uma compreensão mais profunda da sensibilidade com que os grandes mestres da composição ter lidado com a orquestra sinfônica e como cada um fez este notável instrumento servir suas idéias musicais das formas mais claras e mais vívidas.
A arte da orquestração é necessariamente altamente pessoal. O som orquestral de Wagner, por exemplo, é muito diferente do de Brahms, mesmo que esses dois compositores viveram no mesmo tempo.
A esse respeito, a orquestração é semelhante à harmonia, melodia, ou qualquer outro parâmetro da música. É, contudo imprescindível que se adquira as capacidades básicas da arte, a fim de torná-los pessoal num momento posterior. O ouvido será o fator decisivo na escolha dos instrumentos bem como combinações dos instrumentos. É por essa razão que iremos imediatamente nos concentrar no desenvolvimento do ouvido tentando torná-lo capaz de ouvir e distinguir cores.
É o objetivo desse livro é familiarizar o leitor com o som distinto, particular que cada instrumento faz em solo e em combinação com outros instrumentos, bem como as técnicas usadas para produzir estes sons.Assim, quando uma nota de uma cor especial é ouvida no ouvido interno (ou mente), será possível escrever na partitura para realização na performance. Walter Piston colocou isso de forma suscinta: “Você tem que ouvir o que você colocar na página.” Vamos chamar isso de “ouvir mentalmente.”
Comparado com o desenvolvimento de outras áreas na disciplina de música, orquestração, tal como a conhecemos, é uma retardatária. É bem verdade que os instrumentos têm sido usados desde os primórdios da história, mas eles foram empregados em sua maior parte para acompanhar vozes ou improvisar durante ocasiões festivas. Além disso, durante a Idade Média e da Renascença, o compositor raramente, ou nunca, especificava o instrumentos exatos para realizar as várias partes, designando curtamente como “soprano, contralto, tenor ou baixo” ou uma cor (timbre) de corda, sopro, metal ou familía das teclas. No prefácio de sua ópera Combattimento (1624) Monteverdi escreveu: "Um humor uniforme básico em uma peça musical postula uma combinação imutável de instrumentos durante todo o tempo." Até mesmo nos últimos anos da década de 1740, Leopold Mozart esceveu no prefácio de uma de suas serenatas que “se o músico que toca trombone alto for inadequado, deve ser solicitado a um violista para executar a parte de trombone na viola.” Mas, em meados do século XVIII, esta era uma anomalia e não a norma.
Desde o início de 1600, a orquestra como a conhecemos começou seu desenvolvimento bastante lento. Aprendemos com escritores como Francis Bacon que, em meados do século XVII na Inglaterra, havia ainda dois tipos de consorts: musica fracta, o quebrado ou consort heterogêneo e musica sociata, o inteiro ou consort homogêneo.
Contudo, orquestras foram surgindo em muitas das cortes da Itália, França e Alemanha. Podemos dividir a história da orquestra em dois amplos períodos:
1) dos principios da orquestra até a morte de Bach e Handel por volta de 1750;
2) da Escola de Mannheim School, Haydn, e Mozart até o presente.
Durante o primeiro período, houve uma ênfase na estabilização de toda a orquestra.O naipe das cordas foi o primeiro a ser explorado, pois a construção dos quatro instrumentos constituintes – violino, viola, violoncelo e o contrabaixo – foi aperfeiçoado até o final do século XVI. A instituição de concertos públicos no século XVIII foi o catalizador para a criação gradual de uma orquestra com múltiplas cordas. Os meios de comunicação de ópera e balé também foram consideravelmente auxiliados pelo avanço da técnica orquestral, bem como o interesse por cores muito específicas. Lully, já em 1686, usou uma orquestra de cordas mais duas flautas (ou flautas doce), dois oboés, dois fagotes, duas trompas, dois trompetes, e tímpanos. Novamente, deve-se dizer que essa orquestra não foi até agora universalmente aceita. Ao longo de sua vida, Bach experimentou todos os tipos de combinações orquestrais, especialmente como acompanhamento para suas cantatas. No caso dele, como assim foi geralmente verdade para os compositores daquele período, a disponibilidade de intérpretes em grande parte ditava a constituição de sua orquestra. Na época de Haydn e Mozart, a estabilização foi quase atingida, e foi aceita que uma orquestra como algo distinto de um grupo grande câmara, foi constituída de três diferentes naipes: as cordas (primeiros violinos, segundos violinos, violas, violoncelos, e contrabaixos), os sopros (duas flautas, dois oboés, duas clarinetas, e dois fagotes), e os metais (duas trompas, dois trompetes, e tímpanos). Ali a seção da percussão não esteve separada como ainda na orquestra sinfônica padrão, mas ajudava a existir na orquestra de ópera. Tais instrumentos como caixa-clara, bombo, triângulo, e pratos foram comumente encontrados nas partituras de ópera. Observe, entretanto, que os tímpanos foram classificados com os metais na orquestra clássica. A razão para isso era utilitária, uma vez que os tímpanos sempre tocavam juntos com os trompetes. Raramente há casos em que os dois são usados separadamente. Sempre houve confusão a respeito de porque os trompetes são colocados abaixo das trompas, até mesmo nas partituras orquestrais mais modernas, apesar de os trompetes costumam tocar em uma região mais aguda do que as trompas. A razão é histórica: as trompas foram usadas na orquestra antes dos trompetes, e os trompetes foram colocados próximo dos tímpanos desde que sua música foi geralmente associada.
Desde o período clássico, houve um rápido crescimento e expansão da orquestra. Primeiro, os instrumentos auxiliaries tais como flautim, corne-inglês, clarineta-baixo e contrafagote ali foram adicionados aumentando a extensão do naipe dos sopros, e outros instrumentos foram levados para a orquestra sinfônica da ópera. (trombones, harpas, e a ampla bateria de percussão). Berlioz conduziu orquestras enormes para ocasiões específicas em que as seções dos sopros, metais e percussão foram mais que duplicadas e o naipe das cordas foi muito ampliado. Na época de Mahler e Stravinsky, a grande orquestra, tal como a conhecemos hoje, foi uma norma aceita. As cordas em vez de 6, 6, 4, 4, 2, foram 18, 16, 14, 12, 10 (os números, é claro, significa o número de músicos em cada uma das cinco seções das cordas). Nem foi incomum empregar seis flautas, cinco oboés, seis clarinetas, quatro fagotes, oito trompas, quatro trompetes, quatro trombones, duas tubas, duas harpas, piano, e um grupo de instrumentos de percussão que requerem quatro a cinco músicos.
Não somente o tamanho da orquestra aumentou, mas a sua utilização tem crescido mais sofisticado. Quando não importa o instrumento que desempenha uma determinada parte, o compositor abdica assim da responsabilidade pela orquestração, e, pelo menos da perspectiva de hoje, ele ou ela não estão muito preocupados com problemas timbrísticos. Entretanto, como a orquestra transformou-se em um enorme aparato e cada nota, acorde, timbre, e nuance torna-se uma parte integral da composição, foi necessário para codificar a arte da orquestração para que pudesse ser ensinada. Alguns dos grandes orquestradores do século XIX sentiram-se compelidos a definir as suas idéias e percepções.
Dois dos textos excepcionais de orquestração do século XIX são os de Berlioz (revisado por Richard Strauss) e o de Rimsky Korsakov. Ambos os tratados estão preocupados com as técnicas de cada instrumento separadamente e as várias combinações que tenham tido êxito nas próprias obras. Rimsky-Korsakov usou suas próprias obras apenas para ilustrar cada ponto, ele era, afinal, um grande orquestrador e um experimentador ousado que nos forneceu idéias e explicações que não teria sido possível se ele tivesse usado obras de outros compositores.
Tem sido dito que Maurice Ravel foi convidado por sua editora para escrever um livro sobre orquestração. Ele respeitosamente negou-se a fazer, mas teria dito a seus amigos que se ele fosse escrever um volume incluiria tudo em sua própria música orquestral que, em sua visão teve uma orquestração mal feita. Visto que nós temos considerado Ravel um dos verdadeiros gigantes da orquestração, como muito interessante, teria sido ter um livro como esse, pois não se pode pensar da escrita orquestral de Ravel como fraco de qualquer maneira. Nesse sentido, é importante notar que gostos em orquestração mudam e muitos dos problemas empregados sobre essas mudanças serão discutidas nos capítulos 15, 16, e 17. Devemos estar cientes de que grandes músicos como Wagner, Mahler, Weingartner, Mengelberg, Toscanini, Beecham e outros, se encarregaram de "melhorar" sobre as orquestrações e sinfonias de Beethoven Schumann para atender as orquestras maiores e as sonoridades orquestrais que estavam na moda no final do século XIX e início do século XX. Também deve ser mencionado que Mozart re-orquestrou Messias de Handel, adicionando clarineta e trombones ao original a fim de satisfazer aos ouvidos do final do século XVIII nas audições.
A arte da orquestração hoje é mais sofisticada e intrincada. Também é altamente individual, dependendo muito do gosto e até mesmo o preconceito do compositor ou orquestrador. Percebendo isso, deve-se dominar as técnicas de escrita para cada instrumento e ouvir atentamente as várias combinações. Muito pode ser aprendido da redução de uma partitura para seu mínimo essencial de modo que possa ser executado no piano, ou de “ampliar” uma partitura a partir de uma parte de piano. Esse tipo de atividade tem sido uma prática comum bem utilizada por cem anos e oferece lições inestimáveis sobre a clareza e coloração na orquestra. Tais orquestradores fabulosos como Ravel, Debussy, Stravinsky muitas vezes compuseram suas mais avançadas partituras orquestrais originalmente para piano e depois orquestraram-nas, enquanto Webern e Berg cuidadosamente fazem arranjos para piano de grandes partituras orquestrais de Schoenberg e Mahler, a fim de torná-los mais fáceis de estudar. Atualmente, o compositor ou orquestrador é muitas vezes chamado para re-orquestrar certas obras para os nossos grandes estabelecimentos de educação musical. No decorrer desse livro, todas essas e outras possibilidades práticas serão discutidas. Espera-se que a organização desse texto facilite o cumprimento de qualquer tarefa em orquestração que possa surgir.
Ao longo do livro, os instrumentos mais comumente utilizados na orquestra sinfónica moderna recebem a mais ampla exposição. Por outro lado, com o advento de tantos conjuntos Renascentistas e grupos heterogêneos e grandes de câmara, considerou-se importante incluir instrumentos peculiares a tais conjuntos, e descrever as técnicas e conceitos básicos associados a alguns desses instrumentos. Em um apêndice, mais referências são dadas no caso de mais informações serem desejadas sobre os instrumentos que serão discutidos sem profundidade.
Referêcia bibliográfica
*Adam Carse, History of Orchestration (New York: Dover, 1964), p. 337.
ADLER, Samuel. The study of orchestration. 3rd ed. Trad. Marcos Ferreira Mendes (Marcos F.M.). New York: W.W. Norton & Company, Inc., 2002. p. 3-6. (marcostreminhao70@yahoo.com.br)
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