sexta-feira, 22 de junho de 2012

Século XVII "O Período Inicial" - Traduzido do livro: The History of Orchestration de Adam Carse

 

Capítulo III

Século XVII. O Período Inicial

Adam Carse
Tradução de Ricardo Mazzini Bordini


O último quartel do século XVII aproximadamente marca a conclusão do estágio inicial da história da orquestração. Àquela época a orquestra de cordas a quatro partes padrão sucedeu o agrupamento de instrumentos de cordas tanto em três como em cinco partes o que era até então a regra nas obras orquestrais dos compositores italianos, franceses e alemães. Alessandro Scarlatti (1659-1725) e Henry Purcell (1659-1695) são os mais proeminentes daqueles cujas partituras exemplificam o axioma de que as cordas são mais bem manejadas em quatro partes, nomeadamente, 1os. Violinos, 2os. Violinos, Violinos Tenores, Violoncelos, e Contrabaixos, estes dois últimos tocando o baixo da harmonia em oitavas como instrumentos de sonoridade de oito e dezesseis pés.
No final do século a orquestra de cordas estava finalmente determinada na constituição, e a sonoridade de cordas produzida por instrumentos inteiramente do tipo violino estava firmemente estabelecida como a sonoridade fundamental da orquestra.
Um exame das partituras deixadas por compositores cujas vidas estenderam-se de cerca do final do século XVI até perto do final do século XVII demonstram o estado e o crescimento da arte orquestral durante seu primeiro ou inicial período. Cronologicamente isto conduzirá a história quase até o tempo dos dois grandes compositores da primeira metade do século XVIII, Bach e Handel, que com Rameau e Gluck por sua vez tocam ou sobrepõem-se à obra dos pais da orquestração moderna, Haydn e Mozart. Mas um período intermediário, o qual pode convenientemente ser rotulado Scarlatti-Purcell, deve ser colocado entre o período inicial e o de Bach-Handel.
Deve ser entendido que esta divisão em períodos é feita por motivo de método, clareza, e como um auxílio para a memória, e está baseada na obra destes compositores e seus contemporâneos mais do que na duração real de suas vidas.
O período inicial abarca a obra de muitos compositores italianos proeminentes antes do tempo de Scarlatti, nomeadamente Cavalieri, Peri, Monteverde, Gagliano, Landi, os dois Rossi, Cavalli, Cesti, Legrenzi, Carissimi, Stradella, e muitos outros; Lulli, o famoso compositor de Ballet e Ópera Franceses, e seus sucessores imediatos; alemães contemporâneos tais como Schütz, Albert, Tunder, e Hammerschmidt. Em suas vidas e por suas obras prédatadando Scarlatti e Purcell, estes compositores escreveram quase invariavelmente para cordas tanto a cinco como a três partes, com um uso não sistemático e irregular de instrumentos das madeiras conforme estiveram à sua disposição em diferentes lugares e em diferentes ocasiões.
Para o músico atual treinado no sistema educacional de escrita a quatro partes, o agrupamento de vozes ou instrumentos em quatro partes parece natural e quase inevitável. Esta convenção, entretanto, não existia para o compositor orquestral primevo, para quem era igualmente natural escrever em cinco ou em três partes. Ambos os sistemas eram adotados por praticamente todos os compositores deste período, o grupo de cinco partes para movimentos introdutórios, Sinfonie, Ritornelli, Danças, Marchas, etc., também para partes de coro duplo, e o grupo de três partes às vezes para obras inteiras, e geralmente para acompanhamento de solos vocais quando nada além de uma parte de baixo-figurado era provida; também para muitos Ritornelli introdutórios, intermediários e conclusivos. “Sinfonia a 5” é um título freqüente para aberturas puramente instrumentais as quais ocorriam em quase todas as obras até o advento da “ouverture” francesa.
Os instrumentos requeridos não eram geralmente especificados com clareza nas partituras mais antigas. Instruções escritas às vezes declaravam que a música era para ser tocada por “todos os instrumentos”. Os compositores aparentemente contentavam-se em escrever tantas partes, e deixavam ao acaso, costume, circunstâncias variadas, ou ao julgamento de outros a decisão de como as partes deveriam ser distribuídas entre os instrumentos disponíveis. A única orientação fornecida é a clave e a extensão de cada parte, as quais poderiam naturalmente ser a primeira consideração ao distribuir as partes já escritas aos instrumentos de vários tamanhos e afinação. Praetorius, na sua Syntagma Musicum (1615-20), dá alguns detalhes de como este processo de ajustamento de instrumentos às partes era feito. Ele escreve, que se uma parte estava escrita na clave de sol, ou com a clave de dó na segunda linha, aquela parte poderia ser dada para violinos Discant ou cornetti tocar. Da mesma maneira para instrumentos Tenor ou Baixo seriam dadas partes com claves apropriadas, em resumo, qualquer parte que fosse adequada à sua extensão. Os compositores eram claramente não muito preocupados com o equilíbrio ou com o timbre. Os efeitos de combinações específicas de colorido instrumental dificilmente entrariam em seus cálculos quando uma parte fosse passível de ser tocada por instrumentos com tal diferença de qualidade de timbre e intensidade como violinos ou cornetti, violas tenor, violinos, ou trombones, violas baixo, fagotes, ou trombones baixo. Esta aparente indiferença com o efeito instrumental, entretanto, não é tão notável quando é lembrado que sob as condições prevalecentes no século XVII, o compositor como regra era também o regente, e poderia assim preparar a execução de uma obra ele próprio, destinando as partes e supervisionando o resultado pessoalmente.
Partituras posteriores sugerem que uma orquestra de cordas era requerida pela aparição ocasional das palavras violini ou violons, e umas poucas dão especificações exatas dos instrumentos. Disto pode-se deduzir que a disposição mais comum da orquestra de cordas a cinco partes era como segue: 1os. violinos, 2os. violinos, 1os. tenores, 2os. tenores, e baixos. A clave de sol, tanto na primeira quanto na segunda linha do pentagrama era sem dúvida usada para parte de violino agudo, mas as claves de dó de alto e tenor não fazem uma distinção clara entre violas e violinos de registro de tenor.
A orquestra de cordas a três partes parece ser invariavelmente para dois instrumentos agudos e baixos; claves, extensões, e instruções ocasionais indicam que violinos eram universalmente preferidos para as duas partes superiores. O baixo-contínuo é, como regra, a única parte de baixo fornecida nas partituras. Quando uma parte separada de baixo de instrumentos de cordas é escrita, os termos violone (violino grande) ou basses de violons são às vezes vinculados, mas não é de forma alguma claro se o instrumento de sonoridade de oito ou o de dezesseis pés era pretendido, ou se ambos eram usados juntos1. A palavra violoncello não ocorre até o final do século, tempo em que as violas* estavam evidentemente banidas da orquestra exceto para partes solo ocasionais.
Mais tarde no século XVII os poucos primeiros de uma longa linha de violinistas-compositores práticos, começando com Vitali, Corelli, e Torelli, adotaram o mesmo método de escrever duas partes de violino e uma de baixo. À eles e seus sucessores é devido o desenvolvimento da verdadeira técnica do violino que pelo final do século tinha dado um estilo distintivo para a música escrita para instrumentos de cordas, e tinha finalmente individualizado as vagas e ambíguas partes que muitos dos primeiros compositores operáticos imparcialmente distribuíam entre instrumentos de capacidades e timbres totalmente diferentes. Massas de Sonatas para dois violinos e um baixo-figurado foram despejadas daquele tempo em diante, e um manejo similar da orquestra de cordas em três partes permaneceu uma forte influência através do século XVIII à despeito da quarta parte disponível para instrumentos tenor. Muitas das obras de Handel, Haydn, e Mozart, e seus contemporâneos é realmente a três partes, as violas usualmente seguindo o curso da parte do baixo uma oitava acima.

Referências Bibliográficas

Carse, Adam. The History of Orchestration. New York: Dover, 1964. Pp. 32-5 [a 1a . edição é de 1925].
Tradução de Ricardo Mazzini Bordini (bordini@ufba.br)

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1 Warnecke no Der Kontrabass, Hamburg, 1909, declara que os contrabaixos foram usados pela primeira vez na ópera em Nápoles em 1700, e na mesma época em Viena.
* Trata-se de instrumentos tipo Viola da Braccio e Viola da Gamba. Não confundir com as Violas atuais [NT].  

2 comentários:

  1. poderia por favor disponibilizar este livro em pdf ?

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    1. Não possuo esse livro, encontrei apenas esse capitulo 3.

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